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Como adaptar mundos para o RPG? - Dose de XP #05

Updated: Mar 26, 2023

Transformar filmes, jogos ou quadrinhos em um RPG de mesa é possível, desde que você escape de sistemas dissonantes e das leis de direitos autorais





No Dose de XP #3, prometi que dedicaria um texto ao tema Adaptações. Sempre prometo textos que não pretendo escrever, mas como um seguidor perguntou “como adaptar?” no Instagram do Metajogo e como tenho pensado sobre o assunto para compor nosso próprio cenário, vou quebrar minha regra e acabar cumprindo uma promessa. Este é o Metamétodo Metajogo para Game Designers de Garagem.

Puxando a ponta solta Resumidamente, um jogo de RPG é formado por sistema + cenário. Adaptar significa usar um cenário pronto. O transcriador pega emprestado de uma obra sua estética, suas ferramentas narrativas, alguns de seus personagens e locações principais. O desafio deste game designer é encaixar aí um sistema que possibilite aos jogadores encarnar personagens que são como aqueles da obra original, e produzir regras para reger um mundo que se pareça com o mundo da obra original. Top papos INSUPORTÁVEIS de quem acha que está sendo interessantíssimo: 1) Sabia que podemos estar vivendo em uma simulação? 2) Sabia que adaptar é mais difícil do que criar do zero porque você não pode inventar? Como o cenário está pronto, o trabalho de adaptação diz respeito ao sistema. Você tem duas alternativas: usar um sistema pronto ou criar o seu próprio. Adaptando o cenário a um sistema conhecido Se você escolher usar um dos sistemas já produzidos, sua primeira tarefa é tentar não estragar o cenário com uma escolha errada. Quer adaptar O Poderoso Chefão? Talvez D&D 5e não seja a melhor opção, ou Don Corleone poderá usar a magia Fly e bombardear a famiglia de Emilio Barzini com bolas de fogo. Mas qualquer escolha de sistema exigirá mudanças no conjunto de regras canônicas (core rules). A questão é: mudar muito ou mudar pouco? Lado bom de mudar pouco: você não precisa ensinar as regras a jogadores experientes. Lado ruim de mudar pouco: será fácil ignorar seu cenário e simplesmente jogar o que já foi publicado Lado bom de mudar muito: parabéns, você criou algo diferente Lado ruim de mudar muito: modificações demais estragam a máquina Sinceramente, não há segredo: se você quer adaptar um cenário já existente a regras já existentes, pare de ler este texto e vá fazer contas. Seu trabalho é apenas estender a lógica da progressão de classes do sistema escolhido às classes novas de seu cenário adaptado – o mesmo para magias, habilidades, monstros, etc. Tentar fazer a obra original funcionar nas fórmulas do sistema publicado. ● Um exemplo inspirador Já adaptamos o tema do Velho Oeste americano ao D&D 5e. O primeiro passo foi cortar a magia. Não cortamos as magias – apenas o caráter sobrenatural dos feitiços. O mago (mudamos o nome desta classe para inventor) podia usar bola de fogo, desde que tivesse uma engenhoca para lançar o combustível. Ele podia fazer ilusões, desde que construísse antes um jogo de espelhos. No D&D, o monge é uma classe associada às artes marciais orientais e caracterizada pelo combate sem armas ou armaduras. No velho oeste, o monge se tornou o bêbado que briga no bar. O druida virou o nativo americano. Criamos uma subclasse para o guerreiro chamada “pistoleiro”. E por aí vai. Criando um sistema para adaptar o cenário Se você escolheu a alternativa de inventar as regras que vão reger o cenário, talvez tenha uma ideia original para rolar dados. Talvez tenha pensado em uma nova mecânica divertida. Talvez você simplifique o que está desnecessariamente complicado. Talvez você esteja insatisfeito com o funcionamento dos sistemas publicados, e sua contribuição pode solucionar um problema de várias pessoas. Todas essas alternativas são justificativas válidas para a criação de um novo sistema. Mas, caso você não se encaixe em nenhuma delas, considere poupar seu tempo e aderir a um velho sistema já publicado. Como criar sistemas é um assunto que – adivinhe – merece um texto próprio no Dose de XP, mas por enquanto quero deixar apenas um aviso: o tema é fascinante e profundamente discutido e, por isso, você pode se apaixonar pela criação de regras. Mas não se deixe levar. Tenha sempre o produto final em mente. O sistema não deve ser o protagonista, pois os jogadores não vivem as regras – o que ocupa suas imaginações enquanto jogam é a narrativa, e a história mora em outro domínio que não a das fórmulas matemáticas. A função do sistema é fazer o cenário funcionar, e não o contrário. Sem mais delongas: como começar? Você já tem a estética; como animá-la com dados e tabelas de progressão de personagem? O conselho é puxar uma ponta solta. Ao invés de construir regras que vão prescrever como todo o jogo funcionará, tente encontrar uma regra que descreva um fenômeno essencial no cenário que você quer adaptar. Pode ser uma magia, uma habilidade de classe, um mecanismo de batalha. O importante é trocar a tarefa grande, difícil, que provavelmente precisaria de muita correção, pela tarefa pequena e possível, que irá te auxiliar a encontrar mais regras. Quer adaptar Naruto para RPG de mesa? Não faça isso, não é de bom tom. Quer adaptar Popeye para RPG de mesa? Talvez a ponta solta seja o espinafre como uma poção de força, que te levará a pensar em como a força e demais atributos funcionam, e pensar em como outros vegetais atuam no corpo dos marinheiros. Quer adaptar Star Wars para o RPG de mesa? Se você simplesmente sair inventando regras para fazer funcionar naves e armas e raças alienígenas, você vai ter um trabalho imenso e acabar com um universo desbalanceado e genérico. Para que seu jogo tenha o sabor de Star Wars, não basta incluir os figurantes do filme – você tem de descrever os elementos únicos do filme em termos de regra. Comece, por exemplo, descrevendo o jedi. No seu jogo, jedi serão uma classe? Por que todos os jogadores não escolheriam esta, que é claramente a categoria de personagens mais fortes dos filmes? Para evitar o desbalanceamento, você será forçado a pensar nas regras que regem outras classes, fortalecendo as habilidades dos pilotos e dos contrabandistas, importando a eles o sabor único da obra original. (Não sei se os processos mentais de construir regras e de encontrar regras são diferentes. Mas, sempre que estou criando qualquer coisa, prefiro pensar em termos de descoberta, pois isso sugere que a obra final tem um funcionamento interno, orgânico, independente dos possíveis erros de seu criador. Solucionar, desvendar, investigar – estes são verbos que questionam se a regra encontrada está de acordo com sua concepção da obra. Talvez o resultado final ainda esteja mal definido neste momento inicial, mas você pode contar com seus instintos para inferir o que funciona. Por outro lado, o verbo inventar sugere possibilidades demais. Inventar regras pode significar erros quando você ainda está tateando no escuro; arriscar qualquer passo sem um palpite instintivo significa correções pendentes no futuro.)

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