A dificuldade mais comum entre mestres iniciantes é reconhecer o que pode ser modificado sem danos. Então, vamos alterar tudo para evitar o risco de desabamentos.
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Nesta segunda-feira, recebemos por e-mail uma pergunta frequente: “Convenci meus amigos de que jogar RPG seria legal, mas não tenho experiência e não sei criar uma história do zero. Por qual aventura devo começar?”. Eu respondi indicando as aventuras publicadas que são as mais recomendadas para introduzir novos jogadores ao universo de D&D – A Mina Perdida de Phandelver (The Lost Mines of Phandelver) e A cidadela sem sol (Sunless Citadel), publicada em inglês na coletânea "Tales of the Yawning Portal".
São campanhas curtas, fáceis de compreender, com todos os clichês introdutórios para quem não conhece o sabor das narrativas passadas em Abeir-Toril (goblins orientados por vilões discursantes). Porém, fiquei com a impressão de que eu poderia ter feito mais pelo mestre iniciante. Mesmo seguindo à risca todas as instruções das campanhas publicadas, muita coisa pode dar errado – “A Mina Perdida” pode ser mortal demais e A Cidadela Sem Sol foi chamada de “A Cidadela Sem Sal” por um crítico ranzinza.
Além disso, já existem muitas listas de melhores aventuras publicadas e começar a jogar continua sendo uma barreira, então podemos fazer melhor. Segue o Metamétodo Metajogo para Mestrantes Iniciantes:
Inventar uma história do zero?
Existem preocupações demais impedindo o mestre iniciante de ser o Tolkien – ele está ocupado com o ritmo da aventura, o desafio dos monstros, a verificação das regras. Ter de pensar em uma história do zero é um desafio que deixa a barreira de entrada ainda mais alta; e receber prontos os mapas, NPCs, ganchos e motivações é um conforto.
Entretanto, precisar ler todo o livro antes de jogar a primeira aventura também deixa a barreira mais alta. Os livros campanha precisam ser melhor estruturados. É impossível saber quais partes serão indispensáveis para a história central e quais são descartáveis até que se tenha lido tudo. (Comentamos melhor sobre essa estupidez na análise de Tomb of Anihilation, uma aventura que requer a insuportável leitura de centenas de páginas que podem nem ser conhecidas pelos jogadores).
Por isso, a não ser que a aventura publicada em questão seja realmente curta (como a Cidadela Sem Sol e suas 20 páginas), as aventuras para iniciantes não ajudam muito. O que sugiro é… roubar o que te interessa. Plágio, furto, desfalque, desvio, subtração, surripianço, golpe, ladroagem, ladroíce, pilhagem, espoliação.
O nome técnico é adaptação, mas eu quis ser enfático. Use mapas e NPCs de aventuras publicadas ou de imagens encontradas na internet. Adeque o enredo de um livro, filme ou jogo que você goste e seus jogadores desconhecem (pontos extra se você convencê-los de que foi você quem inventou). Adeque os monstros do bestiário conforme sua conveniência: um dragão fraco ou goblin forte? Claro, vá em frente. Você está aprendendo a jogar, não tentando fazer jus ao conhecimento arcano.
Entenda: eu não sugiro que você sempre faça isso. Mas sua primeira vez mestrando será ruim como toda primeira vez, e você não quer queimar uma aventura publicada com sua inexperiência. Adaptando sua própria história, você se livra da pressão de “mestrar corretamente” um grande clássico do RPG. Você minimiza as chances de esquecer pontos importantes da história e ficar perdido na trama. Adaptando, o mestre compreende que toda a história é sua e pode ser ainda mais adaptada para reparos conforme esse barco flutua.
Em resumo, mestrar uma aventura pronta requer habilidades que um mestre iniciante ainda não desenvolveu: identificar um enredo central; imprimir ritmo ao descartar ou inserir desafios; saber como as regras resolvem as situações criadas. O novato pode se livrar dessas dificuldades e ainda colher as facilidades das aventuras publicadas ao adaptar o que julgar necessário para contar uma história simples.
O fundamental é que o mestre tenha claramente o enredo central em sua mente, se permita improvisar para aparar arestas, e esteja amparado por referências (que você roubou). As referências são importantes para que você nunca deixe de ter munição: você sabe como o mapa, os monstros, os NPCs e a história se parecem.
Em outras palavras, não fique obcecado por contar corretamente uma história pronta, por usar as fichas dos monstros como aparecem no bestiário, ou por inserir as armadilhas na esquina pré-determinada. Você tem um trabalho mais importante nesse momento.
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